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Angola Janga: um reino de resistência nos quadrinhos
Exemplar do acervo HQ Pixel
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Angola Janga: um reino de resistência nos quadrinhos

Olá leitores desse blog. Eu já disse por aqui a alguns posts atrás, que as histórias em quadrinhos podem ser muito mais do que simples narrativas ilustradas ou diversão para crianças. As HQs são capazes de transformar memórias esquecidas em experiências vívidas, ressignificar momentos históricos e despertar nossa consciência sobre lutas fundamentais. É nesse contexto que "Angola Janga", obra-prima de Marcelo D'Salete, se destaca como um poderoso instrumento de resgate histórico e reflexão social, mergulhando nas profundezas da resistência negra no Brasil colonial através de uma narrativa gráfica única e comovente.

Te convido a ler o texto que trago sobre essa obra, que vem ganhando prêmios no mundo todo e compartilhar nos comentários sua opinião. Bem-vindos a Angola Janga! Boa leitura.

Antes da obra, o Autor

Marcelo D’Salete nascido em São Paulo no ano de 1979 é um renomado quadrinista, ilustrador e professor brasileiro. Mestre em história da arte pela Universidade de São Paulo, iniciou sua trajetória artística ainda na adolescência, quando cursou design gráfico no Colégio Carlos de Campos e começou a trabalhar como ilustrador para editoras. Sua estreia nos quadrinhos aconteceu em 2001, com publicações nas revistas Quadreca e Front. Desde então, D’Salete tem se destacado por seu estilo único e pela profundidade temática de suas obras.

Entre suas produções mais importantes estão as graphic novels Cumbe (2014) e Angola Janga (2017), ambas publicadas pela Editora Veneta. Essas obras exploram, de forma sensível e potente, a resistência negra à escravidão no Brasil. Angola Janga, por exemplo, é o resultado de onze anos de pesquisa e narra a história do Quilombo dos Palmares. O trabalho de D’Salete foi amplamente reconhecido, rendendo prêmios como o Troféu HQ Mix e o Prêmio Jabuti. Além disso, a edição norte-americana de Cumbe, traduzida como Run for It, conquistou o prestigioso Prêmio Eisner em 2018.

Seu trabalho dá uma contribuição muito importante para a literatura infantojuvenil e para a discussão sobre temas como racismo e desigualdade racial.

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Contexto Histórico sobre o quilombo

Palmares é o local onde o quadrinho Angola Janga é ambientado, então vamos contextualizar o que foi este grande quilombo. Primeiramente o termo Quilombo é uma palavra africana que significa “Esconderijo na Mata” de acordo com Eduardo Bueno do canal Buenas Ideias. Inicialmente conhecido como Angola Janga, que significa 'Pequena Angola' segundo Marcelo D'Salete, o quilombo posteriormente ficou conhecido como Palmares. De acordo com as pesquisas feitas pelo autor este quilombo era formado por vários outros quilombos, sendo Palmares o maior deles com certa de 6 mil habitantes.

Palmares se localizava na Serra da Barriga, atual estado de Alagoas ocupando uma área de cerca de 200 km2 e seu início teria sido na época da invasão de Olinda pelos Holandeses por volta de 1630, ocasião essa em que muitos escravos aproveitaram para fugir e se esconderem nas matas. O quilombo, em seu auge teve cerca de 20 mil habitantes, dentre eles a maioria negros, entre fugitivos e nascidos no próprio quilombo. Segundo pesquisa de D´Salete também habitavam em Palmares indígenas e brancos renegados ou rejeitados por vários motivos. Palmares teve um grande líder que foi escolhido pelo próprio povo. Seu nome era Ganga Zumba, e logo após sua morte em circunstâncias controversas assume a liderança do quilombo o negro conhecido como Zumbi. Este havia sido educado por um padre, mas não quis viver fora do quilombo e nem longe de sua cultura, uma vez que a Pequena Angola cultivara as tradições africanas em sua cultura, língua, religiosidade e modos de vida. De acordo com informações levantadas em alguns documentos históricos, Palmares durou entre 1630 a 1694, quando Domingos Jorge Velho, após várias tentativas conseguiu com muita dificuldade, vencer a resistência.

Muito além de um simples quilombo, Palmares se tornou um símbolo atemporal da resistência negra. A luta dos quilombolas ecoa até hoje na busca por justiça social e reconhecimento da população negra, que continua enfrentando as consequências do passado escravocrata. Usurpados em sua dignidade hoje a população negra do Brasil luta pelo direito à educação, trabalho digno e espaço em uma sociedade que ainda hoje teima em menosprezar esse povo. Palmares é nosso grito de liberdade. É o símbolo de resistência!

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A Narrativa: Uma História Romanceada

O Quadrinho Angola Janga não se trata da história verídica ou histórica de Palmares, mas sim “Uma história de Palmares” como o próprio autor sugere na capa do livro. A obra é uma ficção muito bem embasada e contextualizada histórica e culturalmente. Para conceber esta obra extraordinária o autor não poupou esforços e dedicou nada menos que 11 anos em uma pesquisa a documentos históricos e conhecimento do local. De acordo com ele mesmo, a falta de registros da cultura dentro do quilombo fez com que ele recorresse ao estudo da cultura dos povos originários de onde vieram os negros. E dá pra ver o quanto esse trabalho foi cauteloso e bem feito, pois o quadrinho traz uma bagagem cultural que nunca vi em nenhum livro de história.

O autor também visitou o quilombo e o resultado foram ilustrações magníficas do local, da fauna e flora da serra da Barriga.

A narrativa conta de forma romanceada os últimos anos do quilombo. O primeiro capítulo mostra a dificuldade em se encontrar o caminho certo para o mocambo em meio a mata. Seguindo orientações de uma anciã, dois personagens fugitivos seguem guiados por símbolos e marcas nas árvores da mata. São perseguidos e um deles sucumbe aos perigos do mato e acaba encontrado pelos cães farejadores. O outro chega ao quilombo a duras penas.

Vemos também o nascimento daquele que seria Zumbi futuramente. Seus pais mortos pelos perseguidores ficam na floresta enquanto o pequeno zumbi é entregue ao padre da vila. Este o cria, dá-lhe educação cristã e o batiza com o nome de Francisco. Mas infelizmente a perseguição de outros jovens o leva a fugir para o quilombo, abrigando-se e vindo a se tornar no futuro o maior líder da resistência à escravidão dentro dos quilombos.

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Elementos Culturais e Sociais

O livro nos dá uma noção muito precisa da forma como as pessoas viviam no Quilombo. Alí eles tinham uma espécie de Estado isolado, onde havia uma hierarquia em cada agrupamento com líder, guerreiros, trabalhadores e gente comum. Lá se plantava, colhia, criavam-se animais de estimação e para o consumo, como porcos e galinhas. Falava-se as línguas africanas, indígenas e também português, já que além dos negros viviam nos quilombos indígenas e brancos.

As habitações eram bem construídas apesar dos recursos rudimentares. Inclusive suas fortificações resistiram inúmeras tentativas de invasão das entradas com homens armados enviados pelo governador.

A história nos traz também a ascensão e queda de seu primeiro grande líder, o Ganga Zumba, que após uma negociação com o governo veio a ser morto envenenado em circunstâncias controversas. Após sua morte a liderança de todos os grupos de palmares fica com Zumbi, sobrinho de Ganga Zumba. Este não aceitava as condições do governador e treina seu povo para a guerra. Estes resistem bravamente por muitos anos, até que em 20 de novembro de 1695 Zumbi é morto em uma emboscada, mas não sem antes lutar bravamente.

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Importância Histórica e Artística

Marcelo D'Salete representa muito mais do que um quadrinista talentoso. Com "Angola Janga", ele nos apresenta uma obra que transcende o formato de história em quadrinhos, transformando-se em um poderoso instrumento de resgate histórico e reflexão social.

Sua dedicação de 11 anos de pesquisa resulta em uma narrativa que humaniza a história de Palmares, revelando não apenas a resistência heroica de Zumbi e seu povo, mas também a complexidade cultural de um quilombo muitas vezes simplificado nos livros tradicionais.

Os quadrinhos de D'Salete nos convidam a repensar nossa história, olhar para o passado com sensibilidade e reconhecer a importância da luta antirracista. Mais do que uma graphic novel, "Angola Janga" é um grito de liberdade, um documento artístico que preserva a memória de resistência do povo negro brasileiro.

Uma obra que definitivamente comprova que as histórias em quadrinhos podem ser muito mais do que entretenimento: são arte, são documento, são resistência.

Mais uma vez, agradeço por ter vindo até aqui conferir o conteúdo. Não esqueça de deixar seu comentário com suas considerações e sugestões. Deixo abaixo alguns links caso queira saber mais sobre o autor, a obra ou o tema. Volte mais vezes!

Marcos Antônio
HQ Pixel

Canal Buenas Ideias: https://youtu.be/eQd1J1uG9tc?si=qcyUxaERF0K9WKX0
Canal Carta Capital: https://youtu.be/A7AFdpaHyL0?si=PZiVoMAYM8C-O3bf
Site do autor: https://dsalete.art.br/
Canal Vogalizando a História: https://youtu.be/mAuGuRfSSf4?si=-szUbfOhwNlEKws-

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